REGRESSO À BASE - LISBOA

VISTA PARA O MAR...

Acabadas as festas, conquistado algum descanso, estou de volta para continuar a contar-vos as minhas estórias de vida. Uma volta pelo passado que se faz presente em cada lembrança trazida à ribalta, deixando que o mar leve as mais penosas e as purifique como só ele sabe fazer.

Cheguei a Lisboa nos idos de 1960, grávida do meu primeiro filho que fez a sua chegada ao mundo no dia 1 de Junho. Acompanharam-me nessa passagem para a maternidade, o meu Pai e a minha Mãe. A sua presença foi fundamental pois o Pavilhão da Família Militar não era propriamente um luxo de assistência e o meu Pai, médico de grande experiência exerceu a obstetrícia durante longos anos em Angola. A parteira que me assistiu era bastante competente e carinhosa e, por coincidência, assistiu ao nascimento dos outros filhos que lá nasceram. Um nascimento é um acontecimento na vida de qualquer mulher que esteja disponível para aceitar a responsabilidade de trazer ao mundo uma criatura de Deus. A maternidade sempre pulsou no meu peito como um desejo profundo e todos os meus filhos foram muito desejados e recebidos com todo o amor de que somos capazes de oferecer, apesar da juventude e das dificuldades monetárias inerentes à situação vivida na altura. Dediquei-me inteiramente à criação de uma família que foi aumentando naturalmente. Os filhos não eram programados de acordo com os orçamentos, eram simplesmente desejados e amados.
O meu marido acabou por chegar em Dezembro. Nove meses depois nasceu o meu segundo filho que, por um triz, não nascia também sem a presença do Pai. Acabou por nascer 3 semanas antes do tempo para que tal não sucedesse. Devo-lhe isso! O médico, também, disse que tinha sido eu a provocar o parto com a ansiedade, o que é natural. Na verdade, 11 dias depois lá partiu ele para uma nova viagem que durou cerca de um mês. Mais uma vez sozinha, com dois filhos nos braços e a imprescindível ajuda dos meus Pais e duma empregada antiga que se fez avó dedicada e a quem, também, considerei sempre como minha segunda Mãe, pois estava com a nossa Família desde os meus dez anos. Foram tempos difíceis, mas compensados pela alegria de ver realizado o meu sonho de ser mãe a tempo inteiro e ter uns filhos lindos. Vivíamos numa pequena moradia perto da Avenida do Aeroporto, casa que se tornou pequena quando fiquei novamente grávida! Aí o meu Pai já não achou muita graça… Mas, quando nasceu a minha filha, foi uma alegria enorme e uma grande surpresa porque, como já tinha tido dois rapazes achavam que raparigas não seria a minha especialidade… Naquele tempo não havia ecografias, por isso, a chegada dum bebé se tornava um acontecimento a todos os níveis e, por causa disso, sempre tivemos a preocupação de escolher dois nomes para que, à chegada, a pequena personagem tivesse identificação própria e imediata.
Antes deste nascimento, mudámos para uma moradia maior, numa rua acima e, lá ficámos até que, por problemas de partilhas (as casas eram do meu sogro), tivemos de procurar novo poiso. A solução encontrada foi aquela onde ainda vivemos actualmente e que tem o espaço suficiente para criar os quatro filhos que tivemos. A quarta já habitou nesta casa. Entretanto o meu marido pediu para ir para África afim de ganhar um pouco mais e escapar aos Fuzileiros para aonde tinha ido parar depois de se ter especializado em electrotecnia.
Olivais Sul, onde esta casa fica, era considerado um bairro periférico, planeado para albergar pessoas de todas as classes sociais e com uma visão bastante avançada para a época. Hoje em dia, pode-se considerar que é um dos lugares em Lisboa mais agradáveis para se viver. Naquele tempo, não havia facilidades de transportes e devemos ter levado uns três anos até conseguir um telefone fixo!!! Ter automóvel era um luxo fora do nosso alcance e da maioria. Que diferença para os tempos de hoje em que não damos dois passos sem comunicar com alguém, pois ter telefone é quase um acto espontâneo, e os automóveis enchem a cidade de trânsito, por vezes, caótico.
Como já tinha dito anteriormente, o meu marido partiu um mês antes de nascer a nossa segunda filha (quarta em linha de sucessão) que só o veio a conhecer em Lourenço Marques (hoje Maputo) quando ela já tinha cerca de oito meses. Posso dizer, também, que quase não a chegou a conhecer porque, ela teve uma bronquiolite aguda e esteve às portas da morte com dois meses de idade! Escapou graças à dedicação de médicos e enfermeiras do Hospital de D. Estefânia. Foram momentos muito complicados e difíceis de passar como devem calcular. Uma vez mais, família e amigos foram o meu suporte. Imagino o que o meu marido passou à distância.
Entretanto, as saudades foram apertando e foi, então, que resolvemos que seria boa ideia eu ir passar uns tempos a Lourenço Marques, nos períodos em que o navio em que ele navegava, estivesse estacionado no porto. Para lá chegar tive de lutar bastante, visto que não havia as mínimas facilidades concedidas às famílias dos militares em comissão. Em Angola já havia terrorismo, mas em Moçambique só aconteceu mais tarde, aliás, só soube do facto no dia em que lá desembarquei!!! Essa estória fica para a próxima.

Fiquem bem, neste ano que agora começa.

Comentários

Aldina Duarte disse…
Uma Mulher e uma Mãe a sério é das combinações mais perfeitas e admiráveis que conheço na natureza humana... parabéns cá espero na próxima viagem como sempre...

beijos linda Senhora
(Mulher + Mãe= Senhora), esta é uma formula criada por mim:-)
Maria Emília disse…
Obrigada querida Amiga. As minhas vivências puseram-me à prova muitas e muitas vezes! Ultrapassar tantos obstáculos só podia acontecer com as ajudas que me foram proporcionadas pelos meus Deuses, mais uma força interior que fui/vou descobrindo passo a passo. Na minha prática de ensino tento mostrar que todos temos essa força e que só é preciso deixá-la emergir quando a ocasião surge.
A próxima viagem promete...
Um abraço
OM SHANTI

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